O desvario da escrita encarcerada: o relato da misoginia no Brasil Colônia em Carta à rainha louca, de Maria Valéria Rezende
Palavras-chave:
patriarcado; mulheres no período colonial brasileiro; violência de gênero na literatura brasileira contemporâneaResumo
Em Carta à rainha louca (2019), a escrita de Rezende articula o interesse por um tipo especial de narrador, caracterizado pelo teórico Wayne Booth (1980) como não confiável, com a desestabilização do discurso histórico. Este trabalho objetiva analisar como se dá essa interlocução na leitura da misoginia no período setecentista brasileiro. Para tal, ele conta com o aporte de estudos teóricos voltados às relações entre literatura e história. Como a imaginação literária interroga o passado sobre as subjetividades silenciadas, subjugadas e violadas por uma ordem patriarcal vigente desde a pré-história da humanidade, cuja crueldade se intensifica nas vivências de mulheres atravessadas pelo colonialismo, constitui sua questão norteadora. Assim, em um percurso de leitura e análise de tipologia bibliográfica, adotando uma perspectiva metodológica comparatista entre o romance citado e a obra D. Maria I (2019), da historiadora Mary Del Priore, chegamos a uma possível resposta. Através do uso dos recursos da ambiguidade, da ironia e do paradoxo, Rezende nos conduz ao relato da confecção de uma carta de forma e conteúdo incomuns, repleta de rasuras legíveis. A ré e remetente pouco tem a esperar da nobre destinatária, em contrapartida, as experiências dessas duas Marias têm muito a dizer às leitoras do presente sobre a história da interdição das mulheres às instâncias de poder.
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