Lugar de atuação e tarefas das mulheres: a natureza (φύσις) como justificativa dos costumes (νόμοι) no Econômico, de Xenofonte

Autores

  • Janaína Silveira Mafra Universidade Federal de Minas Gerais – Belo Horizonte – MG – Brasil

DOI:

https://doi.org/10.14195/1984-249X_34_23

Palavras-chave:

Xenofonte, Econômico, natureza (φύσις), costumes (νόμοι)

Resumo

Xenofonte foi um dos autores clássicos mais desconsiderados do último século. O descrédito que marcou seus escritos socráticos é uma consequência das conclusões a que chegaram, no começo do século XX, alguns historiadores que buscavam uma solução à Questão socrática. Segundo alguns comentadores, desde as origens dessa Questão, o testemunho de Xenofonte foi submetido a críticas impiedosas:

  1. 1) Xenofonte não era um filósofo, mas, sim, um militar e político e

  2. 2) Xenofonte se empenhava em defender seu mestre da acusação de ser subversivo, representando a ordem estabelecida e os valores tradicionais.

Em harmonia com tais comentadores (L.-A. Dorion, L. Brisson e L. Rossetti), pensamos que Xenofonte é um filósofo cuja obra tem qualidades que lhe são intrínsecas. Entretanto, pensamos também que, se, por um lado, hoje a reabilitação dos escritos socráticos de Xenofonte está bastante avançada, por outro lado, não devemos silenciar toda e qualquer problematização do conteúdo de sua filosofia, pois tal tentativa seria tão nociva quanto aquela de silenciar o filósofo. Partindo dessa consideração, o intento deste artigo é mostrar que - embora Xenofonte, no Econômico, estabeleça pela boca de Iscômaco qual é o lugar de atuação (χώρα) e quais são as tarefas ou funções (ἔργα) das mulheres no âmbito da cidade, alegando que elas devem se ater ao interior da casa e exercer as tarefas ou funções que lhes são próprias por natureza (φύσει), o que os costumes (νόμοι) confirmam -- o argumento da natureza (φύσις) tem nesta obra o papel retórico de justificar os costumes (νόμοι), protegendo-os de investidas críticas.

Referências

Bibliografia

CAMPELO, A.; GOMES, C. (1998). Aristóteles. Política Porto, Vega Universidade.

CHANTRAINE, P. (1949). Xénophon. Économique Paris, Les Belles Lettres.

DORION, L.-A. (2011). Xénophon. Les Mémorables Paris, Les Belles Lettres . (1 ed. 2000)

LEROUX, G. (2004). Platon. La République Paris, GF Flammarion. (1 ed. 2002)

PEREIRA, M. H. da R. (2005). Platão. A República Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian.

POMEROY, S. (1994). Xenophon. Œconomicus. A Social and Historical Commentary. Oxford, Clarendon Press.

PRADO, A. L. de A. P. (1999). Xenofonte. Econômico São Paulo, Martins Fontes.

TORRANO, J. (2003). Hesíodo. Teogonia: a origem dos deuses São Paulo, Editora Iluminuras.

Secundária

AZOULAY, V. (2009). Cyrus, disciple de Socrate ? Public et privé dans l’œuvre de Xénophon. Études platoniciennes:Socrate:vie privée, vie publique 6, pp. 153-173.

BRISSON, L. ; DORION, L.-A. (2004). Pour une relecture des écrits socratiques de Xénophon. Les études philosophiques 2, 69, p. 137-140.

DORION, L.-A. (2018a). Socrate Paris, Presses Universitaires de France/Humensis.

DORION, L.-A. (2018b). Comparative Exegesis and the Socratic Problem. In : DANZIG, G.; JOHNSON, D.; MORRISON, D. (eds.). Plato and Xenophon: Comparative Studies. Mnemosyne supplements: monographs on Greek and Latin language and literature, Boston, Brill, p. 55-70.

DORION, L.-A. (2003). Akrasia et enkrateia dans les Mémorables de Xénophon. Dialogue XLII, p. 645-672.

FOUCAULT, M. (1990). História da sexualidade. O uso dos prazeres Trad.: Maria Thereza da Costa Albuquerque. Rio de Janeiro, Edições Graal.

HELMER, É. (2023a). La reciprocidad al centro: economía y Antropoceno desde el Económico de Jenofonte. Rev. Filosofía Univ. Costa Rica LXII, 164, p. 81-91.

HELMER, É. (2023b). La esposa de Iscómaco y las dos Aspasias en el Económico de Jenofonte. Texto apresentado no evento Women in the Socratic Tradition ISSS, Rio de Janeiro, October 26-27, p. 1-10.

HELMER, É. (2022a). Semelhantes inferiores: quais lugares para as mulheres na cidade justa de Platão? Trad. Janaína Mafra. Añansi: Revista de Filosofia 3, 1, p. 152-167.

HELMER, É. (2022b). A remodelagem política do oîkos na República: da família ao modelo familiar, da economia doméstica à economia política. Trad. Janaína Mafra. Añansi: Revista de Filosofia 3, 1, p. 143-151.

HELMER, É. (2021a) Semblables inférieures : quels lieux pour les femmes dans la cité juste de Platon ? Plato Journal 21, p. 97-109.

HELMER, É. (2021b) Oikonomia, philosophie grecque de l’économie Paris, Classiques Garnier.

HELMER, É. (2011). Le remodelage politique de l’oikos dans la République: de la famille au modèle familial, de l’économie domestique à l’économie politique. Plato Journal 11, p. 1-11.

LESSA, F. (2010). Mulheres de Atenas: mélissa - do gineceu à agorá Rio de Janeiro, Manuad.

LLOYD, G. E. R. (2018). Phusis/natura/nature : origins et ambivalences. Dans DESCOLA, P. Les Natures en question Paris, Odile Jacob, p. 19-32.

LLOYD, G. E. R. (1991). The Invention of Nature. In: LLOYD, G. E. R. Methods and Problems in Greek Science: Selected Papers Cambridge, Cambridge University Press, p. 417-434.

LORAUX, N. (2001). Aspasie, l’étrangère, l’intellectuelle. Clio. Histoire, femmes et sociétés [En ligne] 13, p. 2-16. Disponível em http://clio.revues.org/index132.html Acessado em 20/10/2023.

» http://clio.revues.org/index132.html

PIRONTI, G. (2020). Notes de voyage en pays parisien (Deuxième partie : Invitation au voyage. Autour d’Hestia-Hermès - Paris, 19 octobre 2007). Cahiers Mondes anciens. Histoire et anthropologie des mondes anciens [En ligne] 13, p. 9-29. Disponível em http://journals.openedition.org/mondesanciens/2686 Acessado em 06/06/2024.

» http://journals.openedition.org/mondesanciens/2686

ROSSETTI, L. (2015). O diálogo socrático Trad.: Janaína Mafra. Col. Cátedra (UnB). São Paulo, Editora Paulus.

SRONEK, M.-L. (2018). Des femmes invisibles dans l’Athènes Classique ? Les effets du travail pour une redefinition de la place des femmes dans la vie publique. Archimède. Archéologie et Histoire Ancienne [En ligne] 5, p. 134-144. Disponível em https://shs.hal.science/halshs-01826270 Acessado em 06/06/2024.

» https://shs.hal.science/halshs-01826270

VERNANT, J.-P. (1990). Mito e pensamento entre os gregos. Estudos de psicologia histórica Trad.: Haiganuch Sarian. Rio de Janeiro, Paz e Terra.

Instrumentos filológicos

BAILLY, A. (1969). Abrégé du Dictionnaire Grec-Français Paris, Ed. Hachette.

CHANTRAINE, P. (1977). Dictionnaire étymologique de la langue grecque Paris, Klincksieck.

LIDDELL, H.; SCOTT, R.; JONES, S. (1996). A Greek-English Lexicon Oxford, Oxford University Press. (1 ed. 1843)

MALHADAS, D.; DEZOTTI, M. C. C.; NEVES, M. H. de M. (2010). Dicionário grego-português Vol. 5. São Paulo, Ateliê Editorial.

Downloads

Publicado

2024-12-02

Edição

Seção

Artigos

Como Citar

Lugar de atuação e tarefas das mulheres: a natureza (φύσις) como justificativa dos costumes (νόμοι) no Econômico, de Xenofonte. (2024). Archai Journal, 34, e03423. https://doi.org/10.14195/1984-249X_34_23